Métodos científicos: método indutivo

Tudo o que pode ser considerado ciência utiliza, necessariamente, um método científico, ou seja, utilizam um conjunto de atividades sistemáticas e racionais que culminam na aquisição de conhecimento válido e verdadeiro. Esse método deve auxiliar as decisões do cientista, definindo os caminhos a seguir e detectando os possíveis erros.

A utilização de um método científico não se restringe à produção de conhecimento científico apenas. Podemos (e devemos) utilizar tais métodos em vários momentos de nossas vidas. Por exemplo: você aprende a fazer bolo de chocolate. Na primeira vez que você faz, ele não fica macio. Lendo a respeito, você descobre que uma das causas pode ser a falta de fermento. Na segunda tentativa, você aumenta a quantidade de fermento (experimentação) e o bolo fica bom.

Em outras palavras, qualquer problema que precise ser resolvido em qualquer momento de nossa vida pode ser resolvido utilizando o método científico.

Não há um só método científico. Com este artigo, inauguro uma sequência que pretende apresentar, além do método indutivo, o dedutivo, o hipotético-dedutivo e o dialético, além de apresentar os métodos científicos nas ciências sociais.

Leia também: Sobre porquê a ciência é a única forma de conhecimento que vale a pena.


Indução é um processo mental por intermédio do qual, partindo de dados particulares, suficientemente constatados, infere-se uma verdade geral ou universal, não contida nas partes examinadas. Portanto, o objetivo dos argumentos indutivos é levar a conclusões cujo conteúdo é muito mais amplo do que o das premissas nas quais se basearam.

Uma característica que não pode deixar de ser assinalada é que o argumento indutivo, da mesma forma que o dedutivo, fundamenta-se em premissas. Mas, se nos dedutivos, premissas verdadeiras levam inevitavelmente à conclusão verdadeira, nos indutivos, conduzem apenas a conclusões prováveis ou, no dizer de Cervo e Bervian (1978:25), “pode-se afirmar que as premissas de um argumento indutivo correto sustentam ou atribuem certa verossimilhança à sua conclusão. Assim, quando as premissas são verdadeiras, o melhor que se pode dizer é que a sua conclusão é, provavelmente, verdadeira”.

Exemplos:

O corvo 1 é negro.
O corvo 2 é negro.
O corvo 3 é negro.
O corvo n é negro.
(todo) corvo é negro.

Cobre conduz energia.
Zinco conduz energia.
Cobalto conduz energia.
Ora, cobre, zinco e cobalto são metais.
Logo, (todo) metal conduz energia.

Analisando os dois exemplos, podemos tirar uma série de conclusões respeitantes ao método indutivo:

  1. de premissas que encerram informações acerca de casos ou acontecimentos observados, passa-se para uma conclusão que contém informações sobre casos ou acontecimentos não observados;
  2. passa-se pelo raciocínio, dos indícios percebidos, a uma realidade desconhecida por eles revelada;
  3. o caminho de passagem vai do especial ao mais geral, dos indivíduos às espécies, das espécies ao gênero, dos fatos às leis ou das leis especiais às leis mais gerais;
  4. a extensão dos antecedentes é menor do que a da conclusão, que é generalizada pelo universalizante “todo”, ao passo que os antecedentes enumeram apenas “alguns” casos verificados;
  5. quando descoberta uma relação constante entre duas propriedades ou dois fenômenos, passa-se dessa descoberta à afirmação de uma relação essencial e, em conseqüência, universal e necessária, entre essas propriedades ou fenômenos.

Leis, Regras e Fases do Método Indutivo

Devemos considerar três elementos fundamentais para toda indução, isto é, a indução realiza-se em três etapas (fases):

  1. observação dos fenômenos – nessa etapa observamos os fatos ou fenômenos e os analisamos, com a finalidade de descobrir as causas de sua manifestação;
  2. descoberta da relação entre eles – na segunda etapa procuramos por intermédio da comparação, aproximar os fatos ou fenômenos, com a finalidade de descobrir a relação constante existente entre eles;
  3. generalização da relação – nessa última etapa generalizamos a relação encontrada na precedente, entre os fenômenos e fatos semelhantes, muitos dos quais ainda não observamos (e muitos inclusive inobserváveis).

Portanto, como primeiro passo, observamos atentamente certos fatos ou fenômenos. Passamos, a seguir, à classificação, isto é, agrupamento dos fatos ou fenômenos da mesma espécie, segundo a relação constante que se nota entre eles. Finalmente, chegamos a uma classificação, fruto da generalização da relação observada.

Exemplo: observo que Pedro, José, João etc. são mortais; verifico a relação entre ser homem e ser mortal; generalizo dizendo que todos os homens são mortais:

Pedro, José, João … são mortais.
Ora, Pedro, José, João … são homens.
Logo, (todos) os homens são mortais.
ou,
O homem Pedro é mortal.
O homem José é mortal.
O homem João é mortal.
…                               .
(Todo) homem é mortal.

Para que não se cometam equívocos facilmente evitáveis, impõem-se três etapas que orientam o trabalho de indução:

  1. certificar-se de que é verdadeiramente essencial a relação que se pretende generalizar – evita confusão entre o acidental e o essencial;
  2. assegurar-se de que sejam idênticos os fenômenos ou fatos dos quais se pretende generalizar uma relação – evita aproximações entre fenômenos e fatos diferentes, cuja semelhança é acidental;
  3. não perder de vista o aspecto quantitativo dos fatos ou fenômenos – impõe-se esta regra já que a ciência é primordialmente quantitativa, motivo pelo qual é possível um tratamento objetivo, matemático e estatístico.

As etapas (fases) e as regras do método indutivo repousam em “leis” (determinismo) observadas na natureza, segundo as quais:

  1. “nas mesmas circunstâncias, as mesmas causam produzem os mesmos efeitos”;
  2. “o que é verdade de muitas partes suficientemente enumeradas de um sujeito, é verdade para todo esse sujeito universal” (Nérici, 1978:72).

Finalmente, uma observação: o “determinismo” da natureza, muito mais observável no domínio das ciências físicas e químicas do que no das biológicas e, principalmente, sociais e psicológicas, é um problema propriamente filosófico, mais especificamente, da filosofia das ciências, pois, no dizer de Jolivet (1979:89), trata-se de justificar o princípio do determinismo, sobre o qual se fundamenta a indução.

A utilização da indução leva à formulação de duas perguntas:

  1. Qual a justificativa para as inferências indutivas? A resposta é: temos expectativas e acreditamos que exista certa regularidade nas coisas, e por este motivo, o futuro será como o passado.
  2. Qual a justificativa para a crença de que o futuro será como o passado? São, principalmente, as observações feitas no passado. Exemplo: se o sol vem “nascendo” há milhões de anos, pressupõe-se que “nascerá” amanhã. Portanto, as observações repetidas, feitas no passado, geram em nós a expectativa de certa regularidade no mundo, no que se refere a fatos e fenômenos. Por este motivo, analisando-se vários casos singulares do mesmo gênero, estende-se a todos (do mesmo gênero) as conclusões baseadas nas observações dos primeiros, através da “constância das leis da natureza” ou do “princípio do determinismo”.

Para Jolivet (1979:89), “o problema da indução científica é apenas um caso particular do problema geral do conhecimento abstrato, pois a lei científica não é mais do que um fato geral, abstraído da experiência sensível”.

Formas de Indução

A indução apresenta duas formas:

  1. Completa ou formal, estabelecida por Aristóteles. Ela não induz de alguns casos, mas de todos, sendo que cada um dos elementos inferiores é comprovado pela experiência.
    Exemplos: as faculdades sensitivas exteriores visual, auditiva, olfativa, gustativa e táctil são orgânicas, logo, toda faculdade sensitiva exterior é orgânica;
    Segunda, terça, quarta, quinta, sexta, sábado e domingo têm 24 horas. Ora, segunda, terça, quarta, quinta, sexta, sábado e domingo são dias da semana.
    Logo, todos os dias da semana têm 24 horas.
    Como esta espécie de indução não leva a novos conhecimentos, é estéril, não passando de um processo de colecionar coisas já conhecidas e, portanto, não tem influência (importância) para o progresso da ciência.
  2. Incompleta ou científica, criada por Galileu e aperfeiçoada por Francis Bacon. Não deriva de seus elementos inferiores, enumerados ou provados pela experiência, mas permite induzir, de alguns casos adequadamente observados (sob circunstâncias diferentes, sob vários pontos etc.), e às vezes de uma só observação, aquilo que se pode dizer (afirmar ou negar) dos restantes da mesma categoria. Portanto, a indução científica fundamenta-se na causa ou na lei que rege o fenômeno ou fato, constatada em um número significativo de casos (um ou mais) mas não em todos.
    Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno e Plutão não têm brilho próprio.
    Ora, Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno e Plutão são planetas.
    Logo, todos os planetas não têm brilho próprio.

Referente ao aspecto do método indutivo, de necessitar de muitos casos ou de um só, Cohen e Nagel (1971:11-104 e 106) registram uma indagação de Mill acerca de por que, muitas vezes, um número elevado de casos verificados (observados, analisados) se apresenta insuficiente para estabelecer uma adequada generalização (por exemplo), que todos os corvos são negros), quando em outras ocasiões, poucos casos (e até um) são suficientes para assegurar uma convicção (por exemplo, que certos tipos de fungos são venenosos)? “Por que em alguns casos é suficiente um só exemplo para realizar uma indução perfeita, enquanto em outros, milhares de exemplos coincidentes, acerca dos quais não se conhece ou se presume uma só exceção, contribuem muito pouco para estabelecer uma proposição universal?” Os autores respondem a esta indagação assinalando que, “se bem que nunca podemos estar completamente seguros de que um caso verificado seja uma amostra imparcial de todos os casos possíveis, em algumas circunstâncias a probabilidade de que isto seja verdade é muito alta. Tal acontece quando o objeto de investigação é homogêneo em certos aspectos importantes. Porém, em tais ocasiões, torna-se desnecessário repetir um grande número de vezes o experimento confirmatório de generalização, pois, se o caso verificado é representativo de todos os casos possíveis, todos eles são igualmente bons. Dois casos que não diferem em sua natureza representativa contam simplesmente como um só caso”.

Regras de indução incompleta:

  1. os casos particulares devem ser provados e experimentados na quantidade suficiente (e necessária) para que possamos dizer (ou negar) tudo o que será legitimamente afirmado sobre a espécie, gênero, categoria etc.;
  2. com a ftnalidade de poder aftrmar, com certeza, que a própria natureza da coisa (fato ou fenômeno) é que provoca a sua propriedade (ou ação), além de grande quantidade de observações e experiências, é também necessário analisar (e destacar) a possibilidade de variações provocadas por circunstâncias acidentais. Se, depois disso, a propriedade, a ação, o fato ou o fenômeno continuarem a se manifestar da mesma forma, é evidente ou, melhor dizendo, é muito provável que a sua causa seja a própria natureza da coisa (fato ou fenômeno).

Para Souza et al. (1976:64), a força indutiva dos argumentos por enumeração tem como justificativa os seguintes princípios:

“a. quanto maior a amostra, maior a força indutiva do argumento;
b. quanto mais representativa a amostra, maior a força indutiva do argumento.”

Sendo a amostra fator importante para a força indutiva do argumento, devemos examinar alguns casos em que problemas de amostra interferem na legitimidade da inferência.

  1. Amostra insuficiente: ocorre a falácia da amostra insuficiente quando a generalização indutiva é feita a partir de dados insuficientes para sustentar essa generalização.
    Exemplos: geralmente, preconceitos raciais, religiosos ou de nacionalidade desenvolvem-se (em pessoas predispostas) a partir da observação de um ou alguns casos desfavoráveis, a partir dos quais se fazem amplas generalizações, abrangendo todos os elementos de uma categoria. Em um pequeno vilarejo do Estado de São Paulo, de 150 moradores, em determinado ano, duas pessoas morreram: uma, atropelada por uma carroça puxada a burro e a outra, por insuficiência renal. Jamais se poderia dizer que 50% da população que falece na vila X são por acidentes de trânsito e 50% por insuficiência renal. Souza et al.(1976:64) citam uma pesquisa realizada com alunos dos colégios de João Pessoa: 40 foram pesquisados, de diversas escolas, e apresentaram quociente de inteligência entre 90 a 110 pontos. Pela amostra insuficiente não se poderia concluir que os estudantes de João Pessoa possuem um QI entre 90 e 110.
  2. Amostra tendenciosa: a falácia da estatística tendenciosa ocorre quando uma generalização indutiva se baseia em uma amostra não representativa da população.
    Exemplo: Salmon (1978:83) cita o famoso exemplo da prévia eleitoral, realizada pelo Literary Digest, em 1936, quando Landon e Roosevelt eram candidatos à presidência dos EUA. A revista distribuiu cerca de dez milhões de papeletas, indagando da preferência eleitoral, e recebeu de volta aproximadamente dois milhões e duzentos e cinqüenta mil. A amostra era suficientemente ampla para os objetivos, mas os resultados foram desastrosos, apontando nítida vantagem de Landon (Roosevelt foi eleito). Dois desvios ocorreram na pesquisa, ambos causados pela classe sócio-econômica dos investigados: as listas para o envio das papeletas foram retiradas de listas telefônicas e de proprietários de automóvel, da mesma forma que uma nova “seleção” se processou entre os que devolveram a papeleta (mais abonados) e os que não a devolveram. E a classe sócio-econômica final da amostra era mais favorável a Landon.

CERVO, Amado Luiz; BERVIAN, Pedro Alcino. Metodologia científica: para uso dos estudantes universitários. 2. ed. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 1978.

COHEN, Morris; NAGEL, Emest. Introducción a la lógica y al método científico. 2. ed. Buenos Aires: Amorrortu, 1971. 2 v.

JOLIVET, Régis. Curso de filosofia. 13. ed. Rio de Janeiro: Agir, 1979.

NÉRICI, Imídeo G. Introdução à lógica. 5. ed. São Paulo: Nobel, 1978. Parte I, Capítulo 6, Parte II, Capítulo 11, itens 11.1, 11.2 e 11.3.

SOUZA, Aluísio José Maria de et al. Iniciação à lógica e à metodologia da ciência. São Paulo: Cultrix, 1976.

Fundamentos da Metodologia Científica

Marina de Andrade Marconi e Eva Maria Lakatos
5ª Edição – Editora Atlas – 2003
Capítulo 4.3

16 pensamentos sobre “Métodos científicos: método indutivo

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