Demarcação científica: a ilusão da neutralidade

Demarcação científica: a ilusão da neutralidade

Maurício Moura

Neste quarto e último capítulo da nossa série sobre demarcação científica, enfrentamos a pergunta crucial: será possível encontrar critérios universais para distinguir ciência de pseudociência?

Ao compararmos a eficácia dos modelos clássicos e contemporâneos nas diferentes áreas do conhecimento, que padrões emergirão? A falseabilidade popperiana, tão eficaz na física, mostrar-se-á igualmente válida na antropologia? Os paradigmas de Kuhn e o modelo sistêmico de Bunge conseguirão superar as limitações dos critérios tradicionais?

Mais importante: que custos políticos e epistemológicos carregam as tentativas de estabelecer demarcações rígidas? E que tipo de ciência queremos construir – uma que hierarquiza saberes ou uma que celebra a diversidade cognitiva?

A jornada que concluiremos aqui questionará não apenas como definimos ciência, mas para quem e para que fins o fazemos.

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A questão da demarcação e os vários saberes

Demarcação científica: modelos sistêmicos e justiça cognitiva

Maurício Moura

Se as abordagens histórico-sociais revelaram a natureza política da ciência, os critérios contemporâneos buscam operacionalizar essa complexidade sem abandonar o rigor metodológico. Este capítulo examina três eixos fundamentais: o modelo sistêmico de Mario Bunge, que propõe dez dimensões interligadas de cientificidade; a abordagem híbrida de Carvalho, que articula critérios epistemológicos e políticos; e a análise dos fatores sociorraciais que desvelam como hierarquias étnicas estruturam a produção do conhecimento.

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O caleidoscópio da demarcação cientifica

Demarcação científica: a politização do conhecimento

Maurício Moura

Se os critérios clássicos de demarcação falharam em estabelecer padrões universais, as abordagens histórico-sociais emergem precisamente para reconhecer que a validação científica nunca ocorre no vácuo. Continuando nossa série sobre a demarcação científica, este capítulo examina como Thomas Kuhn, Imre Lakatos e pensadores sociais deslocaram o debate da lógica formal para as dinâmicas concretas de produção do conhecimento, um movimento radical que revela a ciência como prática humana, intrinsecamente ligada a contextos históricos e relações de poder.

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Critérios de demarcação científica. O que é e o que não é ciência

Demarcação científica: a ilusão da certeza no verificacionismo e na falseabilidade

Maurício Moura

O problema da demarcação científica, esse espinho cravado na carne da epistemologia desde os gregos, permanece tão atual quanto urgente. Em tempos de negacionismo climático, terraplanismo ressuscitado e medicalização seletiva, a pergunta “o que é ciência?” transformou-se de exercício acadêmico em arma de guerra cultural. O Círculo de Viena e Karl Popper ofereceram as respostas mais influentes do século XX, armados com a convicção de que a lógica e a empiria bastariam para traçar uma linha nítida entre conhecimento válido e superstição. Sete décadas depois, suas soluções mostram-se não apenas incompletas, mas perigosamente enganosas quando aplicadas como critérios universais.

Este artigo desmonta os alicerces desses modelos clássicos, demonstrando por que verificacionismo e falseabilidade falham redondamente como critérios absolutos de demarcação. Suas limitações não são meras curiosidades filosóficas: são falhas estruturais que perpetuam hierarquias epistêmicas, excluem saberes legítimos e instrumentalizam a ciência para projetos de poder. Nas trincheiras do debate público, onde se decide desde políticas de vacinação até currículos educacionais, entender essas limitações é questão de sobrevivência cognitiva.

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Pós-Modernismo e fascismo: anatomia de uma síntese reacionária

Maurício Moura

O ressurgimento global de movimentos autoritários no século XXI, paralelamente à crise dos paradigmas racionais, demanda análise das relações entre pós-modernismo e o que Umberto Eco denominou “fascismo eterno” 1. Este artigo examina como elementos do fascismo histórico ressurgem em discursos que instrumentalizam críticas pós-modernas à razão e à verdade objetiva. Partindo da premissa de Jameson 2 sobre a crise estrutural do capitalismo em sua etapa imperialista, argumenta-se que ambas as formas de consciência social emergem como respostas mediadas por esta crise sistêmica. A tese central sustenta que o esvaziamento das críticas pós-modernas de seu potencial emancipatório permite sua cooptação por projetos autoritários, criando sínteses perigosas no campo discursivo contemporâneo.

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Limites da Ciência epistemologia fronteira do conhecimento

Limites do método científico: o que a ciência não estuda (nem quer)

Entenda as barreiras epistemológicas e técnicas da investigação científica

Maurício Moura

O método científico moldou nossa compreensão do universo desde a Revolução Científica, oferecendo um antídoto contra dogmas e superstições. Sua aplicação rigorosa permitiu desde a cura de doenças até a exploração espacial, consolidando-se como pilar do pensamento racional. Contudo, sua eficácia não equivale à infalibilidade.

Este artigo sustenta que o método científico é ferramenta indispensável porém delimitada, operando dentro de fronteiras que definem tanto seu poder quanto suas restrições.

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Cérebro aprendendo a pensar

Métodos lógicos: um guia para pensar melhor

Como identificar, aplicar (e questionar) as ferramentas que usamos para decifrar a realidade.

Maurício Moura

A forma como interpretamos a realidade nunca é neutra. Nossos julgamentos são constantemente filtrados por métodos de raciocínio que, muitas vezes, operam de forma invisível1. Este artigo busca mapear essas ferramentas intelectuais – da dedução clássica à abdução criativa – oferecendo um roteiro para seu uso consciente. Nosso objetivo? Demonstrar que dominar esses métodos não limita o pensamento, mas amplia nossa capacidade de navegar em meio à complexidade do mundo contemporâneo2.

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Sionismo significa a destruição física do povo palestino

Uma análise dialética dos argumentos do sionismo

A discussão sobre o sionismo e a fundação do Estado de Israel costuma ser marcada por forte polarização, entre acusações de antissemitismo e denúncias de colonialismo. Esse quadro dificulta abordagens críticas e emancipatórias que considerem tanto a realidade histórica do antissemitismo quanto os impactos concretos da criação do Estado israelense sobre a população palestina.

Neste artigo, propomos uma leitura baseada no materialismo e na dialética, que parta do princípio de que as ideias, valores e instituições são produtos das condições materiais concretas da vida social, e não expressões imutáveis de identidades ou crenças1. Entender a sociedade é como desmontar um relógio para ver como as engrenagens (condições materiais) se movem e se transformam, e não apenas olhar para as horas (ideias).

Nosso objetivo é analisar os principais argumentos do sionismo — não apenas em seu conteúdo formal, mas nas relações de poder, interesses materiais e contradições que os sustentam.

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O que é dialética: dos gregos à atualidade

O que é dialética

Maurício Moura

A dialética não é apenas um conceito filosófico entre outros, é uma forma viva de pensar que acompanha a humanidade há mais de dois milênios, transformando-se ao longo do tempo sem perder seu núcleo essencial: a compreensão da realidade como um processo marcado por contradições e mudanças. Seu surgimento na Grécia Antiga não foi acidental; emergiu justamente quando os primeiros filósofos começaram a questionar se a verdade poderia ser alcançada apenas pela contemplação estática ou se exigia o confronto ativo de ideias.

Este artigo é minha humilde contribuição para clarificar um pouco a compreensão desta técnica de investigação das coisas do mundo.

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Estudando a ciência da ciência

* Jane C. Hu

Em teoria, o método científico funciona assim: pesquisadores formulam uma questão, constroem hipóteses, coletam dados, avaliam seus resultados e – ta da! – o mundo ganha conhecimentos científicos valiosos. Na prática, é claro, isso nem sempre funciona desse jeito e alguns cientistas estão trazendo isso pra si e indo além de suas áreas de pesquisa principais para estudar onde o sistema pode estar errando.

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