Máfias da soberania: como a extrema direita global opera como crime organizado

Maurício Moura

A ascensão global de movimentos de extrema direita reconfigurou práticas políticas tradicionais, incorporando métodos historicamente associados ao crime organizado. Este fenômeno manifesta-se através de uma hibridização perigosa entre estruturas estatais e mecanismos ilícitos, onde lealdades pessoais suplantam compromissos institucionais (RODRIGUES, 2017). A investigação aqui proposta parte de uma premissa crítica: grupos como a aliança Trump-Bolsonaro operam segundo uma lógica que transcende o autoritarismo convencional, apropriando-se de estratégias típicas de organizações mafiosas, como extorsão sistêmica, evasão financeira transnacional e instrumentalização de crises (G1, 2024; SPITZECK, 2019).

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Pós-Modernismo e fascismo: anatomia de uma síntese reacionária

Maurício Moura

O ressurgimento global de movimentos autoritários no século XXI, paralelamente à crise dos paradigmas racionais, demanda análise das relações entre pós-modernismo e o que Umberto Eco denominou “fascismo eterno” 1. Este artigo examina como elementos do fascismo histórico ressurgem em discursos que instrumentalizam críticas pós-modernas à razão e à verdade objetiva. Partindo da premissa de Jameson 2 sobre a crise estrutural do capitalismo em sua etapa imperialista, argumenta-se que ambas as formas de consciência social emergem como respostas mediadas por esta crise sistêmica. A tese central sustenta que o esvaziamento das críticas pós-modernas de seu potencial emancipatório permite sua cooptação por projetos autoritários, criando sínteses perigosas no campo discursivo contemporâneo.

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Retórica identitária lutas sociais identitarismo

Retórica identitária e enfraquecimento das lutas sociais

Maurício Moura

A ascensão de políticas identitárias nas últimas décadas tem reconfigurado radicalmente o cenário das lutas sociais. Enquanto movimentos históricos por direitos trabalhistas, reforma agrária ou igualdade racial concentravam-se em transformações materiais, uma nova ênfase em identidades subjetivas (quem eu acho que é igual a mim) fragmenta e despolitiza as reivindicações do povo. Essa mudança não é acidental: coincide com a reestruturação capitalista global dos anos 1980, que promoveu o recuo do Estado social e a financeirização da economia. O resultado é a substituição de projetos coletivos de emancipação por microdisputas simbólicas, muitas vezes cooptadas por corporações e governos para camuflar a manutenção de privilégios econômicos.

Nesse contexto, é urgente distinguir entre a pauta democrática, que visa conquistar as reivindicações objetivas dos trabalhadores, e políticas identitárias que, mesmo quando bem-intencionadas, reduzem conflitos sociais a questões de autorreconhecimento ou representação simbólica. Tendências do feminismo liberal, por exemplo, celebram CEO mulheres enquanto ignoram trabalhadoras sem creche. ONGs antirracistas aceitam doações de bancos que financiam prisões em massa de negros. Essa confusão entre identidade e interesse material não apenas enfraquece a resistência popular, mas também alimenta a extrema-direita, que manipula narrativas identitárias (nacionalismo, fundamentalismo religioso) para consolidar projetos autoritários.

Este texto propõe analisar essa dinâmica a partir de quatro eixos: a natureza social das identidades e sua instrumentalização política, a apropriação das causas identitárias pela extrema-direita, a cooptação mercantil das lutas por reconhecimento e propostas para reconstruir a unidade das lutas populares a partir de necessidades materiais.

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O pós-modernismo despido

* Richard Dawkins

Suponha que você é um impostor intelectual com nada a dizer, mas com fortes ambições de ter sucesso na vida acadêmica, reunir um círculo de discípulos reverentes e ter estudantes ao redor do mundo ungindo suas páginas com um respeitoso marcador amarelo. Qual tipo de estilo literário você cultivaria? Não um lúcido, claro, já que a clareza poderia expor sua falta de conteúdo. As chances são de você ter algo como isso:

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Os ataques “pós-modernos” à ciência e à realidade

Victor J. Stenger*

Tendências recentes em alguns círculos acadêmicos têm posto em causa noções convencionais de verdade e realidade. A reivindicação feita nesses círculos é que toda declaração, seja na ciência ou na literatura, são simples narrativas – histórias e mitos que não fazem nada mais do que articular os preconceitos culturais do narrador. Nessa visão, uma narrativa é tão boa quanto outra, uma vez que cada uma é expressa na linguagem de sua cultura particular e, portanto, contém todas as suposições sobre a verdade e a realidade incorporadas nessa cultura. Textos não tem significados intrínsecos. Em vez disso, os seus significados são criados pelo leitor. As conclusões que se tiram é que nenhuma narrativa pode ter validade universal e a ciência “ocidental” não é exceção.

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Manifesto contra a ascensão do pós-modernismo anticientífico

por Martí Jiménez Mausbach, @MartiJim7

“A acusação de cientificista me orgulha. O cientificista é um tipo de sustenta que tudo o que pode ser conhecido é melhor compreendido utilizando o método científico em lugar da improvisação e da especulação desenfreada” -Mario Bunge

Me preocupa como o movimento anti-vacina, espalhado nas regiões mais ricas do mundo, tem provocado a pior epidemia de sarampo dos últimos 20 anos. Me preocupa que grupos políticos percam tempo promovendo moções contra a imaginária conspiração dos chemtrails1 ou as ondas não ionizantes. Me preocupa ver cartazes divulgando cursos de risoterapia ou de reiki em estabelecimentos comerciais sérios. Me preocupa que em uma iniciativa cidadã como o Multireferendo, 34.204 pessoas votaram contra os transgênicos, enquanto dois terços dos espanhóis não sabem que tomates têm genes. Me preocupa ver comissões de espiritualidade dançando em torno de uma espiga de milho no Acampada Sol2. Me preocupa que o velho continente esteja deixando escapar o potencial da biotecnologia agrário por fundamentalismo tecnofóbicos. Me preocupa que no final do ano passado, o presidente da Comissão Européia eliminou o cargo de assessor científico pelas pressões do Greenpeace. Me preocupa que cada vez mais gente considere incompatível, com o ativismo político, uma posição cética em relação a uma ampla gama de pseudociências, que abarcam desde a reflexologia até a psicanálise. Me preocupa que uma ampla massa social de esquerda siga desconfiando da ciência, ao considerá-la parte do stablishment capitalista. Me preocupa, em última análise, a ascensão do intelectualismo New Age, relativista pós-moderno, pseudocientífico e mesmo profundamente anti-científico.

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Teu feminismo burguês me oprime

Claudia S. M.

Teu feminismo burguês me oprime
Quando tentas me impor que sou livre
E me faz lavar teu banheiro, tuas calcinhas,
E dentro da tua casa sou assediada pelo patrão
“Mas quem nunca caiu em tentação … ele é homem” Continuar lendo

Pós-modernismo e a pseudociência que prejudica a mulher

Já tocamos no assunto aqui de como o pós-modernismo ressuscitou o feminismo reacionário, agora vamos compreender um pouco como a retórica pseudocientífica pós-modernista, iguala qualquer mitologia e charlatanismo ao conhecimento científico e acaba colocando em risco exatamente quem diz defender.

No texto a seguir, Claire Lehmann aborda como as hipóteses pós-modernas sobre gênero são prejudiciais à saúde da mulher. Clair é uma livre pensadora e psicóloga que escreve para várias publicações, como o The Guardian e o The Sydney Morning Herald  e está concluindo seu mestrado em psicologia forense.

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Pós-modernismo e o feminismo reacionário

O texto a seguir é uma contribuição ao debate que pretendo fazer aqui sobre a destruição do feminismo revolucionário pelo pós-modernismo e sua influência teórica em outras linhas de pensamento pretensamente revolucionárias, como o altermundialismo. Nele, a socióloga Maria Lygia Quartim de Moraes (doutora em Ciência Política e pesquisadora do Pagu – Núcleo de Estudo de Gênero da UNICAMP e do Grupo “Família, Gênero e Sociedade”do CNPq) analisa o pensamento de Ellen Meiksins Wood (foto), professora de Ciência Política na Universidade York e autora de A origem do capitalismo (2001), Em defesa da história (organizadora, 1999), The Pristine Culture of Capitalism (1992) e The Retreat from Class (1986).

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