Asimov explica o Princípio da Incerteza

Em homenagem ao “grande teórico liberal” Lucas de Moura Lima, para quem a Física Quântica é coisa de comunista, publico um texto do Isaac Asimov onde ele explica o Princípio da Incerteza de Heisenberg.

O texto é curto e simples, escrito por um grande divulgador da ciência. Tenho certeza que Lucas, se fizer um esforço, perceberá que não é tão complicado assim.

Com isto, esperamos que Lucas tenha um pouco de contato teórico com a Física Quântica e comece a perceber que, ao contrário do que ele acredita, o Ciência não é uma invenção dos Lord Sith para levar os desavisados para o Lado Sombrio.

O que é o Princípio da Incerteza de Heisenberg?

Isaac Asimov*

Para explicar o conceito de incerteza, consideremos, inicialmente, o conceito de certeza. Quando se conhece alguma coisa a respeito de determinado objeto, com segurança e exatidão, tem-se certeza aceca de um conjunto de dados, seja lá quais forem.

Mas será que os táquions existem realmente? É possível admitirmos a existência de um universo de táquions que não viola a teoria de Einstein, mas possibilidade de existência não significa necessariamente existência.

E como se chega a conhecer algo? De uma maneira ou de outra, deve-se interagir com o objeto. Deve-se pesá-lo na determinação de seu peso, deve-se golpeá-lo para verificar sua dureza, ou talvez apenas olhar para ele, a fim de ver onde se encontra. Mas alguma interação deve haver, ainda que seja mínima.

Pode-se sustentar que esta interação sempre introduz alguma perturbação na propriedade que se deseja determinar. Em outra palavras, o próprio ato de aprender interfere no objeto em estudo, de forma que no final este não fica conhecido de maneira exata.

A título de exemplo, suponhamos que o leitor queira medir a temperatura da água de sua banheira. Para isso, introduz nela um termômetro. Mas o termômetro está frio e a sua presença na água torna-a um pouco mais fria. Pode-se obter uma boa aproximação da temperatura, mas não com a precisão de trilionésimo de grau. O termômetro alterou a temperatura que estava sendo medida, mas a perturbação por ele introduzida foi quase imensurável.

Como outro exemplo, suponhamos que agora você queira medir a pressão do ar num pneu. Para tanto, utiliza-se de um instrumento munido de pequeno êmbolo, o qual é empurrado por uma pequena quantidade de ar que escapa do pneu. Mas o fato de que o ar escapa significa que a pressão de ar baixou um pouquinho no ato de medi-la.

É possível construir instrumentos de medição tão pequenos e sensíveis, e que se utilizem de métodos indiretos, de forma a não introduzir a menor modificação na propriedade que se deseja medir?

Em 1927, o físico alemão Werner Heisenberg concluiu que não. Um instrumento de medição pode ser muito pequeno, de dimensões tão reduzidas quanto uma partícula subatômica mas não menor. Ele deve utilizar-se de, no mínimo, um quantum de energia, mas não menos. Uma única partícula e um único quantum de energia já são suficientes para introduzir algumas alterações. Se você simplesmente olhar para algo, a fim de vê-lo, isso é possível em virtude do fato de que fótons de luz ricocheteiam no objeto, o que introduz alguma mudança.

Essas mudanças são extremamente pequenas e, na vida quotidiana, podem ser ignoradas, e realmente o são – mas de qualquer maneira as mudanças ainda estão lá. E se estivermos lidando com objetos tão pequenos, para os quais mesmo as menores mudanças assumem grandes proporções?

Se você quisesse saber a posição de um elétron, por exemplo, teria de fazer incidir sobre ele um quantum de luz, ou, mais provavelmente, um fóton de raio gama, a fim de “vê-lo”. O fóton incidente empurraria o elétron, tirando-o de sua posição original.

Heisenberg conseguiu demonstrar, em particular, a impossibilidade de se elaborar qualquer método para se determinar exatamente e ao mesmo tempo a posição e o momento de qualquer objeto. Quanto mais acurada for a determinação da posição, mais imprecisa será a determinação do momento, e vice-versa. Calculou também qual seria o valor da falta de precisão ou “incerteza” em tais grandezas, sendo esse o seu “princípio da incerteza”.

O princípio da incerteza implica em uma certa “granulosidade” no universo. Ao se ampliar uma foto de jornal, chega-se, por fim, ao ponto em que apenas pequenos grãos ou pontos são percebidos, perdendo-se todos os detalhes. O mesmo acontece ao se olhar muito de perto para o universo.

Algumas pessoas ficaram desapontadas com esse princípio, pois julgavam-no uma confissão de eterna ignorância. Mas não é nada disso. Estamos interessados em aprender como o universo comporta-se, e o princípio da incerteza é um fator chave desse comportamento. A “granulosidade” está aí, e isso é tudo. Heisenberg mostrou-nos isso, e os físicos lhe são gratos.


* Isaac Asimov foi escritor e bioquímico nascido na Russia.  Foi um dos maiores autores de Ficção Científica da História e um dos grandes nomes da divulgação científica de todos os tempos.

ASIMOV, Isaac. Asimov Explica. Trad. Edna Feldman. 3ª Edição. Rio de Janeiro: Francisco Alves. 1986.

6 pensamentos sobre “Asimov explica o Princípio da Incerteza

  1. Não está correto!

    Issac Asimov, apesar de seu louvável trabalho para fazer divulgação científica, que por si já é algo questionável, não é, nem de longe, uma referência científica válida na maioria das áreas que fez divulgação científica.

    O princípio da incerteza NÃO implica, em absoluto, em nenhuma “granulosidade” no universo. São coisas assim que suscitam interpretações incorretas. O princípio da incerteza se refere única e exclusivamente à capacidade de medições (observáveis) em nível subatômico. Nada pode ser concluído, a partir daí ou mesmo de toda a Mecânica Quântica, sobre o comportamento real da Natureza. A interpretação e, em especial, a extensão de modelos é muito perigosa, resultando, quase sempre, a erros terríveis. Boa parte “dessas interpretações” violam o Princípio da Conservação da Energia, que é algo, que se ruir, ruirá toda a (pequena) base de conhecimento que temos até o momento.

    Assim, a sugestão é ter cautela com “as referências”, sempre!

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  2. Muito bom!!!

    Com relação ao texto do Asimov, sugiro corrigir alguns erros de digitação:

    No trecho “É possível construir construir instrumentos […]”. A palavra “construir” aparece duas vezes.

    Em “[…] o princípio da incerteza é um fator chave de se comportamento […]” provavelmente, o autor quis dizer “fato chave desse” ao invés de “fator chave de se”

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  3. Não sabia que Asimov havia escrito um texto tentando tornar o princípio da incerteza mais palatável. Obrigado por compartilhar!
    Entretanto, acredito que Asimov não foi tão preciso em sua explicação. Pois, apesar de verdadeiro o fenômeno de interferirmos em um sistema ao interagirmos com ele, esse não é o princípio da incerteza propriamente dito.

    Não sou especialista na área. Nem físico sou, mas já estudei um pouquinho o assunto. Portanto, deixo claro e tenho bastante ciência de que posso estar errado! [Entretanto, Asimov também não era especialista na área e nem tampouco físico.] O que quero expor é o que se segue:

    O princípio da incerteza ocorre ao lado do problema de interferirmos no sistema ao medirmos ele.
    O princípio da incerteza é interpretado modernamente como ocorrendo constantemente, até mesmo em sistemas que não estão sendo medidos. A razão de ser interpretado desse modo é por que, se não fosse assim, estaria violando algum outro princípio da física muito bem estabelecido (até mesmo princípios clássicos, como o do eletromagnetismo).
    Para tentar exemplificar isso, podemos pensar no átomo de Bohr em sua proposta original.
    A proposta original do átomo de Bohr é o modelo planetário. Ou seja, os elétron existem em órbitas ao redor do núcleo. Ora, isso implica que os elétron (sendo partículas carregadas se movimentando nas órbitas) estão sofrendo constante aceleração pelo núcleo (devido à força elétrica entre ambos). [Do mesmo modo que é a força gravitacional entre um planete e um satélite que, constantemente, exerce uma aceleração no satélite, desviando sua trajetória linear para a trajetória em órbita.]
    Segundo as equações de Maxwell para o eletromagnetismo, uma carga elétrica (como e elétron) quando sofre aceleração perde energia na forma de radiação (o que acabaria colapsando um átomo, pois ao perder energia o elétron perde velocidade e ‘cai’ em direção ao núcleo). Desse modo, presumindo correto o eletromagnetismo, e sabendo que átomos existem, o princípio da incerteza nos joga uma luz sobre a questão – o elétron não está percorrendo nenhuma trajetória, também não está em nenhuma posição específica em um determinado tempo, nem com uma velocidade específica, muito menos sofrendo uma variação da velocidade (aceleração). O elétron possui intrinsecamente uma incerteza quanto sua posição e seu momento.
    Isso tem que ser assim para não entrar em contradição com o eletromagnetismo. Se não existir essa incerteza no elétron implica que esse percorre uma trajetória (possui posição, velocidade e aceleração) entretanto, já vimos o problema de existir essa trajetória (implica inexistência do átomo).
    Perceba que o princípio da incerteza deve ocorrer o tempo todo! Pois, no atual estado do pensamento científico, acreditamos que o universo (e do que ele é constituído) existe independentemente da nossa existência. Desse modo, se essa ideia é correta, não é necessário ninguém existir para um átomo existir. E, portanto, o princípio da incerteza ocorre mesmo sem ninguém medir nada!
    A verdadeira origem do princípio da incerteza está no caráter ondulatório das partículas em escala atômica e não nas interações. O resultado previsto pelo princípio da incerteza está na aplicação da equação de Schrödinger em qualquer sistema (mesmo se ninguém medir ele).
    A confusão de Asimov, ao que me parece, é recorrente. Apesar de o fenômeno de interferência entre o sistema medido e a medição também ocorre. De forma que mudamos o resultado de um sistema ao tentar obter mais informações sobre ele (esse fenômeno talvez até possa se enquadrar como um caso do princípio da incerteza, mas o princípio se estende muito além dele).
    Outro ponto que é confundido as vezes é a impossibilidade de se saber o momento e a posição de uma partícula simultaneamente após o experimento com sabermos antes do experimento. O princípio da incerteza faz parte do corpo teórico preditivo de um fenômeno. Isso é, dado um sistema que seja isolável uma variável (como uma grande precisão na posição, por exemplo) não se consegue prever, com grande precisão, qual vai ser o momento da partícula no experimento. [Perceba que é o princípio da incerteza que torna a mecânica quântica uma mecânica de probabilidades.] Posteriormente a um fenômeno é possível calcular com grande precisão a posição e o momento de uma partícula ao mesmo tempo. Entretanto, após o experimento, temos algo similar ao que Asimov fala no texto -alteramos o que estávamos estudado ao medir o fenômeno.

    Asimov está correto, mas bastante incompleto.
    Espero que o exposto tenha sido claro para alguém.
    Os pontos principais são:
    – O princípio da incerteza é a impossibilidade de prever e não, exatamente, de medir.
    – O princípio da incerteza ocorre não somente quando estamos medindo o sistema, mas o tempo todo.
    – Espero não estar errado! hahaha

    Obrigado por expor o quão fraco são os argumentos que sustentam ideologias políticas simplistas e conspiracionistas a ponto de ser dito que ”se é difícil só pode ser mentira”. A realidade é complexa em seu funcionamento físico e social. A mecânica quântica é uma teoria fascinante tanto quanto o materialismo histórico.
    Física quântica é coisa de comunista também! Na verdade, é de qualquer um que tendo acesso à informação também tenha curiosidade, dedicação e reconheça que achar que algo é difícil é muito provavelmente resultado da sua ignorância com o assunto do que uma conspiração política.

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  4. Na mecânica quântica mais “moderna”, este princípio, que muitos a consideram fundamentais e está relacionado com as medidas, é considerada como sendo uma simples relação matemática (chamada de relações de Robertson, 1929). Estas relações exprime as incertezas entre dois observáveis A e B em função do comutador [A,B], isto se encontra em qualquer livro de MQ.

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