A incerteza na medicina

Harriet Hall*

Uma das razões que me levaram à medicina foi a ideia ingênua de que médicos sempre sabem o que fazem. Eu estava errada. Marya Zilberberg acertou quando disse que “a única certeza sobre a medicina é a incerteza”. Históricos de pacientes são incertos, exames físicos são incertos, testes são incertos, diagnósticos são incertos, tratamentos são incertos, até a anatomia humana é incerta. Médicos não são cientistas, eles são usuários práticos da ciência que aplicam evidências científicas ao cuidado do paciente. Medicina trata de probabilidades e suposições informadas, não certezas. Sintomas podem significar várias coisas. Eles podem ser um sinal de doenças sérias exigindo tratamento, uma doença que ainda não sabemos identificar e tratar, uma condição benigna que se resolverá sem tratamento, uma hipersensibilização de funções corporais normais, depressão, transtorno de somatização, simulação de doença ou um pedido de ajuda.

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Pós-modernismo e a pseudociência que prejudica a mulher

Já tocamos no assunto aqui de como o pós-modernismo ressuscitou o feminismo reacionário, agora vamos compreender um pouco como a retórica pseudocientífica pós-modernista, iguala qualquer mitologia e charlatanismo ao conhecimento científico e acaba colocando em risco exatamente quem diz defender.

No texto a seguir, Claire Lehmann aborda como as hipóteses pós-modernas sobre gênero são prejudiciais à saúde da mulher. Clair é uma livre pensadora e psicóloga que escreve para várias publicações, como o The Guardian e o The Sydney Morning Herald  e está concluindo seu mestrado em psicologia forense.

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Violência obstétrica: a “medicina” contra a ciência

O termo violência obstétrica é amplo. Engloba os procedimentos, físicos ou não, que a mulher passa que não estejam baseados na ciência desde a gestação, o trabalho de parto, o parto, o pós-parto ou o abortamento. A lista dessas violências é extensa: agredir verbalmente ou fazer comentários constrangedores sobre a mulher ou sua família, recusar ou dificultar o atendimento, não permitir acompanhante, fazer lavagem intestinal, raspagem dos pelos, jejum, episiotomia (alargar o carnal de parto fazendo um corte no períneo) ou separar a mãe do bebê saudável após o nascimento são apenas alguns exemplos.

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O florescente mercado das “desordens psicológicas”

Surgido há 50 anos, o uso de antipsicóticos, a despeito de seus pobres resultados, tornou-se maciço na medicina psiquiátrica norte-americana. Na população geral, 1.100 pessoas (850 adultos e 250 crianças) se unem todos os dias à lista dos destinatários da ajuda financeira federal por motivo de problema mental severo

por Olivier Appaix

Criada em 2008, em Denver (Colorado), a empresa de exames médicos de imagem CereScan pretende diagnosticar os problemas mentais por meio de imagens do cérebro. Um documentário exibido no canal Public Broadcasting Service (PBS)1 mostra seu funcionamento. Sentado entre os pais, um menino de 11 anos espera, silencioso, o resultado da IRM2 de seu cérebro. A assistente social pergunta se ele está nervoso. Não, ele responde. Ela mostra então as imagens à família: “Vocês estão vendo? Aqui está vermelho, e aqui, alaranjado. Mas deveria estar verde e azul”. Tal cor sinaliza depressão; outra, os problemas bipolares ou as formas patológicas da angústia.

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Ritalina, a droga legal que ameaça o futuro

É uma situação comum. A criança dá trabalho, questiona muito, viaja nas suas fantasias, se desliga da realidade. Os pais se incomodam e levam ao médico, um psiquiatra talvez.  Ele não hesita: o diagnóstico é déficit de atenção (ou Transtorno de Deficit de Atenção e Hiperatividade – TDAH) e indica ritalina para a criança.

O medicamento é uma bomba. Da família das anfetaminas, a ritalina, ou metilfenidato, tem o mesmo mecanismo de qualquer estimulante, inclusive a cocaína, aumentando a concentração de dopamina nas sinapses. A criança “sossega”: pára de viajar, de questionar e tem o comportamento zombie like, como a própria medicina define. Ou seja, vira zumbi — um robozinho sem emoções. É um alívio para os pais, claro, e também para os médicos. Por esse motivo a droga tem sido indicada indiscriminadamente nos consultórios da vida. A ponto de o Brasil ser o segundo país que mais consome ritalina no mundo, só perdendo para os EUA.

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The New Creationism - O novo criacionismo

O que a ciência tem a dizer sobre o criacionismo

Em um posicionamento contundente, a Sociedade Brasileira de Genética (SBG) publicou um manifesto que questiona frontalmente as bases científicas do criacionismo, alertando para seus impactos no ensino e na formação acadêmica no Brasil. O documento, intitulado “O que a ciência tem a dizer sobre o criacionismo”, estabelece uma clara demarcação entre o domínio da fé religiosa e o campo da ciência experimental, reafirmando que a Teoria da Evolução por Seleção Natural — fundamentada em “evidências e dados experimentais” acumulados ao longo de 150 anos — constitui o pilar unificador das ciências biológicas contemporâneas. Ao destacar que explicações baseadas “na fé e crença religiosa” não integram o conteúdo das disciplinas científicas, a SBG posiciona-se contra a inserção de ideias criacionistas (incluindo o Design Inteligente) em escolas e universidades, defendendo que tais concepções, embora válidas como expressões teológicas, representam “pseudociência e obscurantismo” quando apresentadas como alternativas ao conhecimento científico. O manifesto surge como resposta à crescente divulgação dessas ideias no país e evoca figuras históricas como Galileu e Darwin para sublinhar a necessidade de proteger o ensino científico de interferências dogmáticas.

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O Julgamento do Macaco

O professor John Scopes

As tentativas de impor o obscurantismo através da força sempre permeou o poder, em especial quando a distinção entre Estado e Religião não estão claras. O exemplo mais conhecido disso foi a Idade Medieval, quando Igreja e Estado eram umbilicalmente ligados e a Inquisição se encarregava de torturar e assassinar qualquer um que ousasse discordar dos dogmas estabelecidos.

Essa história todo mundo já ouviu falar, mas ela não acabou por aí. Vários países ainda qualificam a discordância religiosa como crime. Grande parte da Europa tem leis contra a blasfêmia, embora a opinião pública da maioria dos países geralmente consiga impedir sua ação.

Recentemente, um funcionário público da Indonésia foi condenado a cumprir 2,5 anos na cadeia por ter escrito a frase “Deus não Existe” no Facebook (embora líderes religiosos defendessem a decapitação). No mesmo país, cinco adolescentes foram presas por dançar. O Instituto Pew Research Center constatou em 2010 que 5,2 bilhões de pessoas (75% da população do mundo) vivem em locais em que há restrições de crença.

No Brasil não é diferente, com professores obrigando alunos a rezarem e os constantes ataques promovidos pela Bancada Evangélica e os conservadores de plantão (como a PEC 99/11, que iguala o status das igrejas grandes a organizações da Sociedade Civil, como sindicatos e partidos).

Mas o que dizer quando a ciência é classificada como crime?

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Cético X Supersticioso

Cérebro atrofiado por teorias conspiratórias e pseudociência

Se você abrir demais a sua mente, seu cérebro vai cair

Quem nunca se deparou com um defensor da astrologia que tem como argumento máximo a frase “mas funciona”? Geralmente seguido de alguma evidência anedótica com o próprio ou algum amigo ou parente.

O mesmo ocorre com defensores de outras pseudociências, como a homeopatia, quiropraxia ou reflexologia. Não sem surpresa, é o mesmo fenômeno quando se discutem a mediunidade e percepções “extrassensoriais”, medicina “alternativa”, abduções alienígenas e todo tipo de afirmação fantástica anticientífica.

Quando você se aprofunda na discussão com o indivíduo, sempre acaba surgindo, como argumento final, a frase “você precisa abrir a sua mente”.

Pois bem, o músico australiano Tim Minchin lança um desafio a todos esses “pensadores” e propõe inclusive um prêmio.

Além de músico, Minchin é ator e humorista e aborda constantemente temas como pseudociências, religião e fé. Ateu e cético, defende que nossas opiniões e visões de mundo devem se basear na realidade, nas evidências e que todos os dogmas e tradições devem ser desafiados.

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Exorcismo é bobagem!

Exorcismo é a prática de pretensamente expulsar demônios do corpo de pessoas “possuídas” por eles. É uma crença presente em várias religiões, mas especialmente marcante nas denominações cristãs pentecostais e neopentecostais, inclusive a Renovação Carismática, que é ligada à Igreja Católica.

Para quem vive no mundo real, o transtorno de “possessão” é um distúrbio mental ligado a um transtorno dissociativo de personalidade ou a alguns tipos de monomania.

Antes do ser humano começar a conhecer a mente até fazia sentido atribuir as doenças mentais a demônios e djins. Como tudo o mais, o humano atribuía ao desconhecido raízes mágicas e fantásticas. Só que o conhecimento humano sobre a mente já evoluiu bastante e já não faz o mais ínfimo sentido utilizar a fantasia como explicação.

Pior: os rituais de exorcismo são rituais geralmente violentos. Baseiam-se em causar desconforto físico ao “possuído”. São, assim, rituais onde as torturas física e psicológica são constantes e “aceitáveis”.

Sobre esse assunto, Penn & Teller fazem uma pesquisa em seu programa Bullshit! e formulam uma crítica bem humorada sobre a bobagem perigosa e violenta do exorcismo, apresentando dados estarrecedores sobre o tema.

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